Waldir Calmon nos anos 60 e
Separados Nada Somos
(Waldir
Calmon - Don Al Bibi). Esta versão está
em seu último disco: Feito Para Dançar
(Copacabana Discos,1980)
Waldir Calmon tinha uma
agenda cheia, dividindo-se
entre as gravações, a
produtora, os bailes (às
vezes, dois por dia) e a sua
boate. No entanto, os
frequentadores da Arpège
reclamavam quando ele
viajava e era substituído
por outro conjunto, gerando
grande insatisfação. Essa
rotina desgastante durou até
o começo da década de 60,
quando Brasília foi
inaugurada, em 1960. A
mudança da capital federal
do Rio de Janeiro para
Brasília foi um divisor de águas
na noite carioca. Políticos,
empresários e pessoas
influentes deixaram o Rio,
levando boa parte do
dinheiro que circulava na
noite.
Em 1962, Waldir abria um
espaço "jovem" na
Arpège: algumas
tardes passariam a ter
rock, twist, e muito
balanço e ficariam a
cargo de Wilson Simonal,
Reinaldo Rayol, e Renato
e seus Blue Caps, entre
outros. Logo, as tardes
aconteceriam também aos
domingos e Waldir Calmon
fechava contrato com o
Clube do Rock.
Na foto, Waldir e a nova
geração, em 1962. Clique
na foto para ampliar.
A música, em geral, também
passou por uma grande
transformação: no Brasil, a
bossa-nova surgia e, no
mundo, o rock. A ditadura
brasileira trouxe uma
reformulação musical mais
profunda onde as letras
passaram a ter um papel mais
importante e deixaram de ser
mero entretenimento para se
transformar em veículo de
conscientização das massas.
Melodia e ritmo eram
relegados a segundo plano -
dois dos maiores trunfos do
instrumentista Waldir
Calmon. Mesmo assim,
continuou gravando, mas a
vendagem de seus discos
começou a cair
progressivamente. Em 1962,
casou-se com a cantora
Marta
Kelly
e teve seus dois filhos: Marcia
e Marcus.
Por volta de 1966, além das
jovens tardes, a Arpège
passou a exibir shows do
bloco Cacique de Ramos,
levando para o Leme o melhor
das escolas de samba.
Mesmo com todas estas
inovações, a boate não
estava conseguindo se
adaptar à nova realidade da
noite carioca, que havia se
esvaziado com a perda do
status de capital
federal.
O selo Arpège
e a produtora acabaram e,
em 1967, a boate foi
arrendada e passou a se
chamar Sarau, fechando
definitivamente um ano
depois.
Waldir então começou a fazer
temporadas pelo Brasil até
que, em 1969, o diretor
artístico do extinto
Canecão,
Wilton Franco, convidou-o
para animar a casa de
shows em Botafogo, Rio de
Janeiro.
Entre o final dos anos 50 e
começo dos 60, Waldir também
passou a tocar órgão
Hammond,
seguindo a tendência
mundial. Segundo o pianista
e amigo Jota Júnior, ele
adquiriu um Hammond B2
que, pouco tempo depois, foi
vendido para o empresário e
bandleader paulista
Ed Costa. No mesmo dia,
porém, comprou o famoso
Hammond B3 que o
acompanhou profissionalmente
até o fim da vida.
Clique aqui para
ver uma sequência de fotos
de Waldir e seu conjunto
fazendo um anúncio na TV
Ceará.
Cristaleira com alguns
dos troféus, prêmios e
medalhas de Waldir Calmon.
Clique na foto para
ampliá-la.
As partituras a seguir são
uma transcrição, feita por
Waldir (em 1962), da grade
do arranjo do maestro
Pachequinho para a música
Do Rio a Paris
(Marino Pinto - Pernambuco),
gravada por Marta Kelly.
Antes de falar sobre esta
gravação, é preciso
esclarecer como os termos
transcrição e grade
são
usados na música. Quando um
maestro cria um arranjo, ele
o dispõe em uma grade:
uma grande folha
pautada que, dependendo do
tamanho da orquestra ou
banda, será maior ou menor.
Cada instrumento corresponde
a uma pauta (ou pentagrama)
e são dispostos um abaixo do
outro. Desta forma, podemos
observar o que será tocado
por todos os instrumentos no
mesmo compasso. A grade é a
guia do maestro e dali saem
as partituras para cada
instrumento, individualmente
(clique
aqui
para ver um exemplo). A este
processo, chamamos
transcrição. Antes
dos computadores, as
transcrições eram feitas,
manualmente, por músicos que
tinham um belo ponto
("letra") e que eram
chamados de copistas.
Havia um amplo mercado de
trabalho para copistas em
estúdios, rádios e TVs.
Em 1962, Marta foi convidada
pelo compositor Humberto
Teixeira para participar da
5ª Caravana da Música
Popular Brasileira -
grupo patrocinado pelo
governo federal que tinha
como objetivo divulgar a
música popular brasileira no
exterior. Nomes como Waldir
Azevedo, Dalton Vogeler,
Orlando Silveira, Francisco
El Broto Carlos e
Darlene Glória fizeram parte
deste show que viajou por
toda a Europa e parte do
Oriente Médio. Na França,
gravaram dois LPs pela
gravadora Decca. As
quatro músicas em que Marta
fez o solo foram extraídas
dos LPs e relançadas em um
compacto duplo. A gravação
que ouvimos aqui é a do
disco (em péssimo estado).
Do Rio a Paris com Marta Kelly
Capa do boletim da UBC
(União Brasileira de
Compositores) e flâmula
da 5ª Caravana da
Música Popular
Brasileira.
Clique nas miniaturas
para vê-las em tamanho
maior.
Já de volta ao Brasil, Marta
foi convidada para cantar a
mesma música na TV Tupi do
Rio de Janeiro. O maestro
Pachequinho fez um arranjo
diferente do disco, com
cordas e um belo naipe de
sopros, e Waldir fez a
transcrição. Abaixo, algumas
das partituras transcritas
da grade. Infelizmente, não
foi possível escaneá-la por
causa do tamanho. Clique nas
miniaturas para vê-las em
tamanho grande.
Em 1970, gravou o último LP
desta fase,
Waldir
Calmon e seus Multisons
(Copacabana Discos).
Em janeiro de 77, após sete
anos no Canecão,
voltou às viagens. Mas, em
abril do mesmo ano, estreou
na
Churrascaria Roda-Viva,
na Urca, Rio. Em dezembro de
78, recebeu uma proposta "irrecusável",
como ele mesmo definia, da
cervejaria e restaurante Bierklause,
no Lido, Rio. Ficou até
maio de 79, quando a direção
da
Churrascaria Roda-Viva
pediu para que voltasse a
tocar na casa, fazendo uma
contraproposta também "irrecusável".
Voltou a gravar em 78 e
lançou o disco
Discoteque
- Feito Para Dançar.
Em 1980, gravou seu último
LP: FeitoPara Dançar.
Este álbum pareceu um
retorno às origens: deixou o
órgão e voltou ao piano
acústico (que, aliás,
preferia tocar). Seu piano
era valorizado pelo ritmo e
acompanhamento claros -
assim como nas primeiras
gravações.
Certo dia, disse-me que
jamais deixara de tocar um
só dia e que gostaria de
morrer trabalhando. "Não
conheço nada no mundo tão
agradável quanto tocar",
explicou-me. Waldir
trabalhou até a madrugada do
dia 11 de abril de 1982.
Pela manhã, reclamou de "umas
dores estranhas no peito".
Não as levou a sério, pois
detestava ir a médicos, e no
meio de um passeio com a
família teve um enfarte
fulminante. Estávamos indo
comemorar o dia da Páscoa.
Separados Nada Somos com Diamantina Gomes
No player
acima, versão
cantada de
Separados Nada Somos,
de Waldir Calmon e Don Al
Bibi. É uma gravação feita
pela cantora Diamantina
Gomes acompanhada da
orquestra de Osvaldo Borba
(Odeon, 1953). Há alguns
problemas na introdução da
música, devido ao desgaste
do disco, mas o registro é
muito interessante.