Waldir Calmon

Biografia (1944-1960)

Waldir Calmon nos anos 50
Exaltaçao a Bahia  
Na foto, Waldir Calmon na década de 50 com seu inseparável bigode e, no player, Exaltação à Bahia (Vicente Paiva - Chianca de Garcia). Esta música está no CD  Waldir Calmon - Sua Orquestra, Conjunto e Piano, da Revivendo Discos.

Em 1944, Waldir Calmon formou seu primeiro conjunto, Gentlemen da Melodia, e com ele fez uma série de apresentações na rádio Globo. Waldir também atuava como pianista no conjunto da boate Cassino de Copacabana (RJ). Nesse mesmo ano, desligou-se do exército e levou o Gentlemen para trabalhar no Cassino Atlântico de Santos (SP) e, em 1946, com o fechamento dos cassinos, foram para a boate Marabá, na cidade de São Paulo, permanecendo por um ano. Em 1947, desfez o Gentleman da Melodia, pois foi convidado para tocar na recém-inaugurada boate Night and Day, do Hotel Serrador (Cinelândia, RJ), onde permaneceu por oito anos. Na foto, Waldir Calmon e os Gentlemen da Melodia.

Gentlemen da Melodia

O primeiro registro do piano de Waldir em vinil, ainda com o nome artístico Waldir Gomes, é de 1941, na gravação original de 
Leva Meu Samba - acompanhando o autor, Ataulfo Alves (Odeon). Apesar disso, só conseguiu gravar seu primeiro disco-solo em 1951 (Star), com os boleros El Marinerito (Jorge Fargo) e Amorosamente (Tito Ribeiro e Carlos Bahr) com acompanhamento de seu conjunto. Em 1952, gravou pela primeira vez com sua orquestra: Como Eras Linda, de Theo Mackben, e Por Quanto Tempo, de Marino Pinto e Don Al Bibi (Star).
Neste mesmo ano, gravou sua primeira composição - o bolero boogie Baianada (Todamérica).

Em 1952, começou a apresentar o programa semanal Ritmos S. Simon pela TV Tupi e, posteriormente, pela TV Rio. O programa permaneceu dez anos no ar e transformou-se em um disco-brinde que o patrocinador, as lojas de lustres S. Simon, oferecia a seus clientes. Na foto abaixo, Waldir Calmon em seu programa Ritmos S. Simon, na TV Tupi (anos 50).

Waldir no programa Ritmos S. Simon

No final dos anos 1940, a produtora Rádio Serviço e Propaganda Ltda contratou Waldir Calmon e seu conjunto para uma série de apresentações transmitida, em cadeia nacional, pelas Emissoras Associadas (no Rio de Janeiro, pela rádio Tamoio), divulgando seu trabalho por todo Brasil e tornando-o famoso. O programa, produzido por Antônio Maria e apresentado por Luís Jatobá, chamava-se Balcão de Melodias e ia ao ar às terças e quintas-feiras, 21:15h, com o patrocínio do Colírio Moura Brasil. O Balcão de Melodias fez tanto sucesso que a Rádio Serviços montou um estúdio para gravação de discos profissionais e comprou uma fábrica para a prensagem dos vinis, em Petrópolis, RJ. Nascia então o selo Rádio com o dez polegadas Ritmos Melódicos - que possuía oito das músicas mais solicitadas no programa. Waldir entrava para a história fonográfica como o primeiro artista a gravar um long-play de dez polegadas na América do Sul. Nas fotos abaixo: o locutor Luiz Jatobá e um anúncio da Rádio Serviços e Propaganda Ltda na Revista do Rádio (pág 44, n° 17, julho de 1949)

Luiz Jatobá Anúncio da Rádio Serviços e Propaganda Ltda

Ele também gravava muitos jingles, como "duas gotas, dois minutos, dois olhos claros e bonitos" (Miguel Gustavo), do colírio Moura Brasil. Nesta fase, um de seus 78 rotações (Copacabana Discos, 1953) com as músicas Mambo en España (Ramon Marquez) e  Cao Cao Mani Picao (Carbô Menendez) foi um grande sucesso em vendas e execução. O pianista tornou-se famoso e passou a ser solicitado para bailes em todo o Brasil.

E as gravações continuavam: em 56, lançou o LP Samba, Alegria do Brasil (Rádio). Neste álbum, encontramos Na Cadência do Samba (Que Bonito É), de Luís Bandeira (música editada pela UBC), que se transformou em hino do futebol brasileiro, graças à veiculação maciça, em todos os cinemas do país, no noticiário Canal 100. Apesar disso, Waldir Calmon nunca recebeu os direitos de execução. Em 1958, Waldir gravou, pela Rádio, o primeiro disco estereofônico genuinamente nacional, como podemos ler nesta matéria do Jornal do Brasil, de 29/11/1958.

Ritmos Melódicos (Rádio) teve um segundo volume e outras séries de LPs surgiram, como Chá Dançante, Mambos, Para Ouvir Amando e, a mais famosa de todas, Feito Para Dançar (doze volumes). Com ela, Waldir atingiu a impressionante marca de 100.000 exemplares vendidos em 1957 - fenômeno para a época.

A série
Feito Para Dançar foi lançada em 1954 e, com exceção do volume 4, em 12 polegadas, tornando o número 1 o primeiro disco popular editado neste formato no Brasil. Também foi o primeiro LP criado especialmente para
dançar, com um lado ininterrupto de músicas, simulando um baile. A gravadora fez uma ampla divulgação dos 100.000 discos vendidos com a série Feito Para Dançar e ofereceu uma festa,  em 27 de junho de 1957, para toda a imprensa especializada com direito à premiação: um diploma, oferecido pela gravadora Rádio, um disco de ouro e um alfinete de brilhantes no formato da letra R. A festa aconteceu na boate Arpège e o já famoso estrogonofe do chef foi servido aos convidados. Nesta matéria da Revista do Rádio, podemos ler sobre o evento. Fotos do diploma, do alfinete, da divulgação e do evento estão na seção Fotos.

A gravação de Waldir Calmon de Rock Around the Clock, em ritmo de samba, causou grande impacto na época. Segundo o site Senhor F,  "(...) em 1957, uma versão instrumental com o pianista Waldir Calmon, incluída em seu disco Chá Dançante n°3, faria grande sucesso junto ao público adulto. Nos anos setenta, o próprio Bill Haley, em mais uma de suas turnês pelo Brasil - a primeira foi em abril de 1958 - regravou a música com arranjo misturando samba e rock'n'roll, acompanhado do conjunto paulista Lee Jackson (...)".

Waldir inovou e lançou o LP com um lado ininterrupto de música, sem intervalo entre as faixas, ideal para festinhas em casas de família. Criou um estilo próprio de tocar piano, com seus solos em oitavas, que tornava o seu som inconfundível. Chegou a lançar seis LPs por ano e era comum ter três ou quatro de seus discos simultaneamente nas paradas de sucesso. Entre reedições, lançamentos e compactos extraídos de LPs são cerca de 130 títulos.

Abaixo, relação dos mais vendidos (1956). À esquerda, os long-plays e, à direita, os compactos 78 rpm. Waldir Calmon aparece com três LPs nas paradas: Feito Para Dançar n°5 (1º lugar), Feito Para Dançar n°3 (3° lugar) e Feito Para Dançar n° 4 (7° lugar). O texto da matéria diz: "Registramos, com prazer, a volta de um nacional ao primeiro posto da tabela dos discos de 78 rotações. Altamiro Carrilho, o grande flautista, é o herói com o disco Jura. No entanto, os nove seguintes são estrangeiros, confirmando a decepcionante proporção de 9 sucessos estrangeiros para um brasileiro. Os Pobres de Paris, que teve uma longa vida na primeira colocação, passou para segundo. Entre os long-plays, como já chamamos a atenção no número anterior, o rei é Waldir Calmon que figura, como de costume, com três discos da série Feito Para Dançar. É também surpreendente a longa carreira do long-play Ama-me ou Esquece-me que vem se mantendo há alguns meses nas primeiras colocações." A pesquisa foi feita nas lojas: Brasileiras e Barbosa Freitas (ambas em Copacabana), Ramos Elétrica (Ramos), Mesbla da rua do Passeio,  Casa Palermo (13 de maio) e Rei da Voz (as três no Centro do Rio de Janeiro). Clique na foto para vê-la em seu tamanho original.

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Nesta época, gravou com a cantora Ângela Maria o LP Quando os Astros Se Encontram (Copacabana Discos, 1958). Sempre atento às novidades, sugeriu à Ângela que interpretasse uma canção mexicana pouco conhecida no Brasil e ainda que fizesse uns fraseados, aproveitando sua privilegiada extensão vocal. Nascia então um dos maiores sucessos da nossa  "Sapoti": Babalu (Margarita Lecuona). A festa de lançamento do LP aconteceu também na boate Arpège, em nove de maio de 1958, com jornalistas, artistas e amigos de toda a equipe envolvida na gravação.

Waldir Calmon e Ângela Maria

O repertório de Waldir Calmon era composto basicamente por ritmos dançantes e sucessos da época, nacionais e internacionais. "Qualquer música capaz de fazer com que um casal se levante e comece a rodopiar pelo salão me interessa", respondia sempre a quem perguntasse o critério para a escolha de suas canções.

Em 1955, saiu da Night and Day, após oito anos, e abriu sua própria boate na rua Gustavo Sampaio, 840, Leme, Rio de Janeiro - a Arpège. O sucesso foi tanto que outra série de discos, Uma Noite no Arpège, surgiu. Nomes como  Tom JobimChico Buarque, João Gilberto, Doris Monteiro Ary Barroso, entre outros, apresentaram-se em sua boate. Historiadores contam que Vinícius de Moraes foi à boate Arpège assistir a um show de seu amigo Tom Jobim quando conheceu um jovem e talentoso violonista, Baden Powell de Aquino, que também estava tocando nesta mesma noite. Nessa época, Baden já tinha sido gravado por Lúcio Alves (Samba Triste, parceria com Billy Blanco). Em julho de 1966, o show Meu Refrão, com o conjunto vocal MPB-4 (no começo de sua carreira) e Chico Buarque estreou na Arpège. Dois anos depois, estariam juntos novamente no Festival da Record, cantando Roda-Viva (segunda colocada no concurso). Edson Machado, baterista que influenciou muito a bossa-nova, também começou na Arpège.

Waldir Calmon e seu sócio, Maurício Lanthos, inauguraram a Arpège (nome inspirado em um perfume francês), em nove de setembro de 1955, com muita badalação na imprensa - clique aqui para ver um dos anúncios. No começo, as atrações "fixas" eram o próprio Waldir ao piano, a cantora Diamantina Gomes (sua mulher, na época), o crooner norte-americano Louis Cole e Steve Bernard no órgão Hammond - em todo Rio de Janeiro, só Bernard conseguia tocá-lo até Waldir se familiarizar com o complicado instrumento... Esta matéria, na coluna Dicionário Enciclopédico da Noite, de Stanislaw Ponte Preta, (jornal Última Hora,  em 31 de agosto de 1957), conta a história deste Hammond, que foi o primeiro a ser vendido no Brasil, de forma espirituosa. Steve Bernard  tinha saído do Copacabana Palace,Louis Cole, da Vogue. A foto abaixo mostra um anúncio de jornal, falando da inauguração da Arpège:

Anúncio da inauguração da Arpège

Pouco tempo depois, Lanthos vendeu sua parte na sociedade para Agnelo Martins (assistente de produção de Carlos Machado). Já em primeiro de maio de 1956, Agnelo assumia como um dos donos e conduziu de forma brilhante o negócio: a Arpège tornou-se uma das boates da moda graças à sua boa música, ambiente agradável, menu saboroso e preços razoáveis, passando a fazer parte de um seleto grupo de casas noturnas do Rio de Janeiro, todas na região do Leme: Drink (com Djalma Ferreira e, posteriormente, com a família de Cauby Peixoto), Sacha's, Plaza e Fred's. O telefone de reservas da boate, 52-4623, não parava mais de tocar.

Em 1956, comprou o piano Steinway & Sons preto para sua boate Arpege. O belíssimo instrumento pertenceu à filha do Presidente do Brasil (entre 1946 e 1951), Marechal Eurico Gaspar Dutra.
Nesta matéria, da coluna Flagrantes do jornal Correio da Manhã (de vinte de dezembro de 1956), uma nota sobre a aquisição do instrumento. Quando a boate fechou, o piano foi para a casa de Waldir e lá ficou até ser vendido após a sua morte.

Normalmente, Waldir trabalhava com o conjunto  pequeno, porém, quando solicitado, o grupo crescia e dava lugar à
Orquestra Waldir Calmon. Cantores eram  pouco utilizados em discos, mas estavam sempre presentes nas apresentações ao vivo.  O guitarrista Paulo Nunes, que trabalhou com Waldir vários anos, conta que, quando Mílton Banana fez parte do grupo, era um dos percussionistas. Certo dia, Waldir os reuniu e disse que um deles deveria aprender a tocar bateria, pois, naquele momento, estava precisando mais de um baterista do que de vários percussionistas. Mílton então resolveu aceitar o desafio e se tornou um dos bateristas mais importantes do cenário musical brasileiro.

Em 1959, formou a Waldir Calmon Produções Artísticas e fundou o selo Arpège que teriam, como primeiro disco, a reedição do vinil Uma Noite no Arpége 3 - já lançado pelos selos Rádio (1956) e Copacabana (1959). Waldir ganhou vários troféus, prêmios e apareceu também em filmes nacionais: É Pra Casar (Luiz de Barros, 1953), Com a Mão na Massa (Luiz de Barros,1958), Hoje, o Galo Sou Eu (Aloísio T. de Carvalho, 1958) e no documentário Rio à Noite (Aloísio T. de Carvalho, 1962). Em outros filmes, como em Depois Eu Conto (Watson Macedo, 1956), seu piano fez fundo musical para várias cenas.

A vida tinha se transformado para aquele menino pobre: o bonde deu lugar aos novíssimos carros importados; o único terno foi substituído por camisas inglesas, paletós e calças de linho e a velha casa alugada na Tijuca, que dividia com seus irmãos, foi trocada pelos luxuosos quartos de hotéis. Ele também era apaixonado por carros e teve vários modelos luxuosos. Apesar de sua vida basicamente noturna (em boates, teatros e casas de show), Waldir não bebia uma gota de álcool sequer - apenas água e refrigerantes. Fumava muito, mas largou o hábito quando sua primeira filha, Márcia, nasceu.
Biografia (1961 - 1982)